Ironia da vida

Chega de se boicotar minha filha,

tá na hora de você ser muito feliz. (Tati Bernardi)

Quando eu era criança e chegava em casa chorando porque não sabia ler, uma senhora gordinha, dos cabelos cacheados pretos e alguns fios brancos, que eu tive a sorte de ser minha avó, sempre me dizia que um dia eu conseguia e eu consegui. Hoje a leitura é meu maior prazer. Quando eu tinha treze/quatorze anos e era louca por um garoto sem dedo e sem coração e sofri de depressão, minha avó dizia que ia passar, por que não era amor. Realmente não era. Hoje que eu sofro por um homem de dedo torto e personalidade torta, minha avó diz que vai passar e eu acredito, porque ela sempre teve razão.

Sofri quando acabou, mas hoje eu decidi que vou deixar passar. Eu permito ter um coração livre, uma vontade de conhecer sentimentos novos e transformar sentimentos antigos em algo novo, lindo, recíproco. É claro que uma hora eu vou me trancar no quarto e chorar até dormir, mas eu instalei um dispositivo aqui dentro que sempre ao amanhecer me lembra que é um novo dia, que eu tenho a capacidade de fazer tudo diferente.

Sobre os dias que eu fiquei triste, lamentando tudo que aconteceu. Foi apenas limpeza de alma, tirei troços velhos e dei espaços a tesouros novos. Aquela caixinha ali no fundo? É onde eu guardo o que ainda me resta dele. Às vezes eu abro e recolhe os cacos que me restam, mas eu sei que nunca vai ser igual e escondo tudo de novo. Não sei quanto tempo eu ainda farei isso. Pra falar a verdade, quero fazer isso sempre, como quem não quer nada. Quero lembrar o quanto foi bom e o quanto poderia ter sido melhor, pra que assim eu descubra onde mudar.

Tomei algumas atitudes pra transformar tanto sentimento triste em algo feliz. Acordo mais cedo e fico deitada na cama planejando meu dia. Provo algumas roupas e me olho no espelho várias vezes e digo pra mim mesma o quanto eu sou bonita pra ficar em casa sofrendo. Vou trabalhar e troco sorrisos com todos os funcionários, até aqueles que eu nunca sorri. Quando largo compro um doce e dou a minha mãe junto de um beijo. Antes de dormir agradeço a Deus pelas coisas boas e pelas ruins. As boas são lembranças, as ruins aprendizado. Eu decidi que não haverá mais espaço pra tristeza e assim será.

Um dia acreditei que só seria feliz com ele por perto, mas eu me apresentei a pessoa que mais deseja minha felicidade: eu mesma. Ninguém no mundo deseja tanto me vê feliz do que eu. Pra que isso me aconteça preciso deixar lá atrás ele que já me fez tão feliz, que irônico. Minha avó que diz nunca ter beijado na boca, mas teve sete filhos adora uma ironia, mas no fim ela sempre tem razão, assim como as ironias da vida. (Aryelly Cabral)