O menino do trem

Ele é um menino que não pode acompanhar minha louca linha de raciocínio

meio poeta, meio neurótica, meio madura. (Tati Bernardi)

 

Ele só foi aquele que me fez esquecer aquele outro, como qualquer outro um dia seria capaz de fazer. Mas ele é diferente. Diferente de todos os outros que passaram, pousaram um pouco e voaram pra longe. Foi tudo rápido. Ele chegou e ficou. Arrancou raízes velhas e plantou flores novas. Essas flores são coloridas, grandes e são capazes de sobreviverem sem precisar de ninguém. Esse poder que ele teve de levar pra longe o que ainda restava me deixou encantada. Eu sei que ele não tem nada demais. Ele é igual a todos os outros e ao mesmo tempo diferente dentro de mim. Não é amor, não é paixão, não sei dizer o que se trata. Ele é só um menino. Mas eu sinto tanta vontade de fazer ele virar um homem. Pela primeira vez na vida, um homem teve medo de mim. Ele, o cara que foi capaz de tirar o que ainda restava de outro alguém, tem medo de mim. Medo de se envolver com uma mulher de verdade. Que carrega uma bagagem pesada de todo o passado. Uma mulher com amores fracassados, casamento fudido e um coração que é capaz de amar de novo. Ele é só um menino que não aceita a condição de gostar de alguém mais madura, mais louca, mais centrada, mais vivida. Ele é só mais um menino no meio de tantos outros com a diferença que fez meu coração bater mais rápido de novo em alguns dias. Ele é o menino que eu penso em ligar todo dia e perguntar o que porra está acontecendo que ele sumiu. Ele, o menino que eu olho e repito: “eu não vou gostar de você, você é só um menino e eu nunca gostei de menino.” Homem que tem medo de mulher que já foi casada é só mais um menino. Eu sei que ele é um menino, mas queria que fosse o meu menino. Não é amor, é só carência. Carência das brabas que até um pivete faz a gente se apegar. Ele me fez um bem que não imagina. Não sei, não sei o que quero dele, o que eu quero da vida. Mas eu sei o que eu quero de mim. A gente sofre pra cacete, mas quando descobre que passa faz um bem danado. E passou. Mas ele devia ficar. O menino que foi capaz de arrancar o homem que ainda existia dentro de mim, devia ficar. Podia ser uma parada breve. Podia construir um ninho pequeno, frágil. Mas que ele nunca tivesse medo de viver algo com uma mulher de verdade. Ele é o menino que dorme no ponto e deixou o trem da felicidade guiado por mim ir embora vazio. Talvez o trem passe pela mesma estação vazio. Talvez encontre um passageiro sem medo de ser feliz. (Aryelly Cabral)